História política de Lagoa Dourada
Fazendo uma pesquisa na internet
sobre as coisas de Lagoa Dourada, me deparei com este ótimo texto de resgate da
história política lagoense. O texto que se segue é uma adaptação da reportagem de
autoria de José Venâncio de Resende que foi publicado pelo “Jornal das Lajes”
no dia 11 de outubro de 2011. Se você desconhece a história que originou a rixa
“pêgas/orêias” versus “braquiárias”, leia com atenção e se intere um pouco mais
sobre nosso passado político.
Apesar de Lagoa Dourada existir há
300 anos e ter sido emancipada em 1911, os nomes das duas principais correntes
políticas – “pêgas” e “braquiárias” – surgiram há cerca de vinte anos. Foi uma
invenção de Palmério José de Melo, numa alusão aos grupos políticos do antigo
PSD (criadores do jumento Pêga) e da antiga UDN (asinino não come capim
braquiária) que não se misturam.
Os “pêgas” reúnem políticos da
tradicional família Resende que se alojaram no antigo PSD (Partido Social
Democrático), mas que com a ditadura militar de 1964 trocaram o MDB (Movimento
Democrático Brasileiro), seu destino natural, pela Arena 2 e que mais tarde
voltaram às origens, ingressando no MDB/PMDB.
Já os “braquiárias” representam a
tradição da família Rodrigues Chaves que cerrou fileiras na antiga UDN (União
Democrática Nacional), mais tarde Arena 1 (Aliança Renovadora Nacional, fundada
em 1965), e que desembarcou no ninho do PSDB depois de passar pelo PDS (Partido
Democrático Social) nos anos 1980.
Rivalidade entre Braquiárias (PSDB) e Pêgas (PMDB) marca a política de Lagoa Dourada |
Como política não é linear nem
estática, houve pelos caminhos lagoenses “mutações” como, por exemplo, partes
de famílias que migraram para o outro lado ou mesmo o aparecimento de
“intrusos”. Da mesma forma, no cenário local o sistema partidário não segue
necessariamente um alinhamento automático com o que ocorre no território
nacional. Basta lembrar que o PSDB nacional nasceu em 1988 de uma costela do
antigo MDB.
De qualquer forma, as paixões não são
mais tão fortes como antigamente. “A política aqui já foi muito mais ferrenha;
hoje o pessoal está mais aberto”, diz Cláudio Resende, dos “pêgas”. Opinião
esta que nem sempre é compartilhada pela velha geração. “Politicamente, somos
Resende que não passam na mesma pinguela que os Resende de lá”, afirma José
Maria Chaves, o popular Nhô do Toti, dos “braquiárias”.
Um dos protagonistas dessas
“mutações” é Antonio Barreto Pereira Neto da nova geração de políticos de Lagoa
Dourada. A família Pereira foi aliada e defensora da antiga UDN, mas o avô de
Barreto, da Fazenda das Bandeirinhas, rompeu com essa tradição ao se candidatar
vereador pelo então PSD. No rastro do pai, Haroldo Barreto tornou-se vereador
do PSD por vários mandatos.
A eleição de 1976 foi considerada
como a da “traição de Joaquim Silvério dos Reis” pelo “historiador popular”
José Campos de Resende, autor do livro “De Lagoa Dourada”. Tudo começou
em 1954, quando Antonio Pinto foi candidato a prefeito pela UDN, mas foi
derrotado, relata José Campos. Então, Pinto transferiu-se para o PSD e foi eleito
prefeito em 1958. Na eleição seguinte (1962), o PSD trocou de candidato e
manteve o poder em suas mãos.
Depois do mandato tampão de 1971-72
com Gilberto Vieira de Resende, Antonio Pinto volta à prefeitura em fevereiro
de 1973. “Aí veio a traição”, de que fala José Campos. Ou seja, Pinto teria
apoiado o adversário “atrás das portas”, ajudando a eleger José Augusto Pereira
em 1976 pela Arena 1 (ex-UDN) que teve vida longa (16 anos) na administração
municipal (1977-92).
Em 1992, os udenistas (já PDS) foram
derrotados por uma dupla de “intrusos” que aproveitou o momento de
desorganização e fragilidade do PSD histórico (então, PMDB). Trata-se de
Vicente Sebastião da Costa, o Vicentão, e seu vice Sebastião Vitor, que
elegeram na sequencia o empresário são-joanense Rogério Zerlotini, sem tradição
na política local. Mas Rogério rompeu com o “padrinho” e tentou a reeleição
numa disputa que, pela primeira vez, teve três candidatos, ou seja, José Valter
Vieira, pela oposição udenista (atual PSDB), e o próprio Vicentão, como
terceira via pelo Partido Liberal (PL). Nesta divisão, o PSDB foi o vitorioso,
com José Valter, e ficou no poder por dois mandatos (2000-2008).
Apesar de “estranho no ninho”, a
gestão de Vicentão foi uma época de desenvolvimento para Lagoa Dourada, na
visão de José Campos. “Ele promoveu bastante o progresso, com melhoria por
exemplo do meio rural (conservação e construção de estradas e pontes) e a
construção do Parque de Exposição Coronel José de Rezende. Já a administração
de Rogério “foi um período sem brilho”, de acordo com José Campos.
Os Chaves e a UDN
No livro “Lagoa Dourada 300 anos –
Síntese Histórica”, Dauro J. Buzatti relata que o primeiro presidente da
Câmara, que exercia o papel de administrador municipal, foi o médico Abeilard
Rodrigues Pereira (1912-18). Ligado aos Resende e político de destaque, dr.
Abeilard fora eleito deputado em 1891, para o 1º Congresso Constituinte do
Estado de Minas Gerais.
Nhô do Toti conta que seu avô,
Evaristo Rodrigues de Resende, fez parte da primeira Câmara Municipal, depois
da emancipação de Lagoa Dourada, e foi importante chefe político local e aliado
dos ex-presidentes Artur Bernardes e Washington Luís. Os netos de Evaristo,
Antonio de Souza Resende e José Resende Souza, o José Maia – filhos de Aristides
de Sousa Maia e Maria do Carmo de Resende Chaves – foram os fundadores da UDN
em Lagoa Dourada.
O bacharel em direito José Maia foi o
segundo prefeito de Lagoa Dourada, administrando o município por curto período
(28/06/1946 a 29/11/1947). Ele substituiu Ernesto Resende (PSD), que pediu
exoneração após ocupar o cargo por 16 anos seguidos (de 1931 a 1946), de acordo
com Buzatti.
Segundo Buzatti, Ernesto empenhou-se
na manutenção da estrada, ligando Carandaí a Lagoa Dourada, além de aprovar a
elaboração do primeiro plano diretor da cidade e o calçamento de diversas ruas.
Já o terceiro prefeito, Elisiário José de Resende (1947 a 1951), também do PSD,
dedicou-se à nova ligação rodoviária (atual MGT-383) de acesso à capital
mineira, através da antiga BR-3 (atual BR-040), e a cidades vizinhas como São
João del-Rei. Ele ainda administrou o município por mais dois mandatos (1955-59
e 1967-71).
Nhô do Toti, como o pai Evaristo,
nunca se candidatou a qualquer cargo – “o eleitor cobra da gente toda hora,
pelo resto da vida” – mas continua na militância política (é membro do
diretório do PSDB desde a sua criação). Já seus irmãos Geraldo da Aparição
Chaves (Dico do Toti), aposentado da Minas Caixa, e Paulo de Jesus Chaves
exerceram mandatos políticos no legislativo e no executivo municipal. Para Nhô
do Toti, José Valter Vieira (eleito pelo PSDB para as gestões 2001-04 e
2005-08), que teve Dico como vice no segundo mandato, foi o melhor prefeito de
Lagoa Dourada. Quando a corrente udenista começou a ganhar eleições, houve mais
competição, diz Dico do Toti. “Hoje, a cidade está boa, muita construção
nova...”
Um dos símbolos da família Chaves é a
antiga casa da Rua Tiradentes, 94, construída em 1725 por André Rodrigues
Chaves, que veio de Portugal e se casou com uma sobrinha de Tiradentes, Maria
Teresa, de acordo com Nhô do Toti. O primeiro pároco de Lagoa Dourada, padre
Antonio Rodrigues Chaves, neto de André, morou no casarão a partir de 1832,
segundo relato de Buzatti. O imóvel foi alternadamente casa paroquial e residência
da família Chaves até que, em 1978, foi readquirido por Dico do Toti que nele
reside com sua família.
Entre 1912 (ano da criação do município de Lagoa) e 1930, o cargo de executivo municipal era exercido pelo presidente da Câmara Municipal, pois não havia o cargo de prefeito. |
Novas lideranças
A eleição de 2008 foi marcada por
três candidatos na faixa dos 40 anos, ou seja, Antonio Carlos Chaves de
Resende, o Antonio Mangá (PMDB); Alberto Queiroz Soares (PSDB); e David da
Costa Silva (PT). Isto mostra uma renovação dentro da estrutura política
tradicional, observa Barreto que é secretário de Agricultura e Meio Ambiente da
atual administração dos pêgas, presidida por Antonio Mangá. O perfil dos
candidatos não conduz mais para campanhas políticas ferrenhas, diz, mas apesar
da renovação a paixão partidária ainda continua. “Esse Cruzeiro e Atlético não se
dissolveu, não”, resume.
Já o PT é visto como um potencial
gerador de novas lideranças, que também deve colocar pressão sobre as correntes
políticas tradicionais para renovar as suas fileiras, acredita Barreto. Nas
últimas eleições, o PT lançou candidato próprio para a Prefeitura e conseguiu
eleger uma vereadora, Nanci das Dores de Carvalho Melo, tornando-se o fiel da
balança na Câmara Municipal. Tanto que se aliou com o PMDB, indicando Afonso
Campos Maia, então candidato a vice-prefeito, para a Secretaria de Educação e
garantindo assim a maioria de cinco vereadores para os “pêgas”.
Nas eleições de
2012, novamente a disputa passa a ser centralizada entre “orêias” e “braquiárias”,
onde o atual prefeito Antonio Mangá (PMDB) tenta a reeleição contra o seu
antecessor José Valter (PSDB) que busca o seu terceiro mandato.
Um dos principais desafios da
administração municipal 2013-2016 será o de construir um anel viário, que
permita o desvio do tráfego pesado rodoviário (MGT 383) da área urbana de Lagoa
Dourada (nos fins de semana, por exemplo, é intenso o trânsito entre Belo
Horizonte e São João del-Rei/Tiradentes). Ou seja, comerciantes de combustíveis
(postos), indústria moveleira e fabricantes de rocambole temem o esvaziamento
da região comercial da cidade justamente cortada pela rodovia - nada que um bom
trabalho de marketing e publicidade não resolva. Além disso, também há o desafio
da pavimentação da MG-275, ligando Lagoa à Carandaí, e que está em processo
licitatório.
Outro fator de melhoria do
trânsito será o novo terminal rodoviário que, nas palavras de Dico do Toti,
“foi construído no mandato do José Valter, só falta inaugurar”. Atualmente, o
principal ponto de embarque/desembarque de passageiros é feito na Praça Ernesto
Resende. Mas a nova rodoviária, de acordo com Barreto Neto, foi
construída em localização condenada pela engenharia do trânsito. Isto exigiu do
atual prefeito, além de terminar a obra (acabamento), viabilizar a logística de
trânsito e pavimentação do acesso ao terminal.
Só nos resta analisar os planos de
governo dos dois candidatos, votar consciente no dia 7 de outubro e esperar
para ver se serão “pêgas” ou “braquiárias” os responsáveis por administrar
essas e outras questões pelos próximos quatro anos.
FONTE:
José Venâncio de Resende, Jornal das Lajes, 11/10/2011
Dauro Buzatti,
livro “Lagoa Dourada 300 anos – síntese histórica”